Transparência na gestão

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Saiba como se dá a nova prestação de contas em juízo

Por Alexandre Marques

Como cediço todo Síndico está obrigado a prestação de contas em assembleia, pelo menos uma vez por ano, conforme consta do Código Civil no Artigo 1.348, VIII – prestar contas à assembléia, anualmente e quando exigidas; Algumas convenções trazem previsibilidade de prestação, inclusive, semestral, mas, não é mesmo a praxe.

O que a maioria das pessoas desconhece é como se opera isso na prática. E quais os efeitos deste tipo de procedimento.

Primeiramente, vale lembrar que este tipo ação judicial tem previsão expressa no Código de Processo Civil entre os Artigos 550 e 553, e que, alguns procedimentos mudaram em relação ao antigo Código, em vigor até 17/03/2016. A começar pela nomenclatura da ação e sua abrangência.

Agora, não mais se denomina a ação de “Prestação de Contas”, mas, ganhou o rótulo de “Ação de Exigir Contas” e, destina-se àquele que “afirmar ser titular do direito de exigir contas”, assim consta do texto legal.

O síndico ou administrador que precisar “prestar” contas, diante de uma negativa ou impedimento qualquer por parte da massa condominial em aceita-las, deverá utilizar-se da ação de “dar contas” dentro do procedimento comum do mesmo Código, previsto entre os artigos 318 e 512.

Mas o foco de nosso artigo é aquilo que afeta a maioria dos condomínios nesse tipo de divergência, ou seja, a “exigência das contas”.

Isso que ocorrerá quando a massa condominial, por deliberação em assembleia, ou mesmo, na impossibilidade da realização deste ato social da vida do condomínio, exige, através de uma simples Notificação Extrajudicial que o Síndico ou quem esteja habilitado a fazê-lo (§2º do Artigo 1.348 do Código Civil), preste conta.

Isso se dará em juízo dada a impossibilidade ou negativa de realização do ato pela via extrajudicial.

Proposta a ação, em uma primeira etapa o juiz irá verificar se o réu da ação, ou seja, a quem o Autor da ação (condôminos), atribui a obrigação de prestar contas está realmente obrigado a fazê-lo, sempre nos termos da lei.

Da decisão judicial que recepciona ou não o pleito do Autor, cabe Agravo de Instrumento, visto tratar-se de decisão judicial, porém, sem o caráter de sentença, como acontecia no Rito anterior.

Superada esta fase o réu (síndico ou quem tem essa prerrogativa de apresentar as contas), deverá apresenta-las em 15 dias. Pode ainda quedar-se inerte, quanto sofrerá os efeitos da revelia e haverá o julgamento antecipado da lide, ou, contestar a ação.

Nos últimos dois casos o Autor da ação (quem pediu as contas), poderá impugnar ou não as contas apresentadas e se o Réu contesta-la, pode ainda o juiz abrir a instrução probatória, com a devida sentença na sequência. Esta poderá ser de procedência ou não, irá, fixar o saldo devedor (Art. 552 do Código de Processo Civil) e formar-se-á o título executivo judicial de quantia certa.

Ainda em relação aos procedimentos, importante destacar que a forma de apresentação das contas se dará nos termos da lei.

Ou seja, ainda que não mencionada especificamente, far-se-á da forma mercantil, com uma coluna de débito e outra de crédito, assinalando toda e qualquer movimentação financeira, saldos, créditos indiretos, pagamentos, demonstrativos, balancetes, recibos, notas e duplicatas.

Enfim, tudo aquilo necessário para que cada parte envolvida na ação comprove seu procedimento, seja como titular do direito de exigir ou prestar contas.

Ainda nesta ação caberá toda a forma de defesa, ainda que assemelhada a reconvenção, porém, sem este rótulo, ocorrendo esta de forma incidental, nos próprios autos da ação de exigir contas. Onde cada parte poderá pleitear, pugnar, objetar e objetivar ressarcimentos, desoneração, etc., desde que, devidamente comprovado por provas, sejam documentais, testemunhas, etc.

Importante frisar que o prazo prescricional para que o Autor da ação (os condôminos em geral), possam pleitear tal prestação de contas é de 3 anos de acordo com o inciso IV do §3º do Artigo 206 do Código Civil (direito material).

Pela natureza dúplice da ação, afinal, quem tem assume o ônus de gerir patrimônio alheio tem o direito de demonstrar que sua incumbência foi bem desempenhada e desembaraçar-se da incumbência e, quem, igualmente tem o direito de exigir as contas, por óbvio, tem igualmente direito e interesse em fazê-lo, daí, ser a ação de interesse de ambas as partes envolvidas.

O Condômino individualmente não tem legitimidade e interesse processual para propor ação de exigir contas, nesse sentido já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça (Brasília), no seguinte sentido em julgado que reproduzimos a ementa:

“O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para ajuizar ação de prestação de contas contra o condomínio. Isso porque, nos termos do art. 22, §1º, f, da Lei 4.591/1964, o condomínio, representado pelo síndico, não tem obrigação de prestar contas a cada um dos condôminos, mas sim a todos, perante a assembleia dos condôminos. No mesmo sentido, o art. 1.348, VIII, do CC dispõe que compete ao síndico, dentre outras atribuições, prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigidas. REsp 1.046.652-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/9/2014.”

Se as contas foram apresentadas em Assembleia e não foram aprovadas, cabe a ação própria para apurar-se os eventuais prejuízos que a gestão causou ao condomínio, perseguindo a devida indenização de acordo com o preceituado no artigo 927 do Código Civil.

A questão envolverá, muito provavelmente, uma perícia contábil e todos os procedimentos legais necessários para que, atendendo aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, a parte afetada pela ação posso se defender.

Se as contas forem apresentadas e aprovadas, demonstrando-se posteriormente que a aprovação se deu de forma fraudulenta, anulável ou mesmo maculada de qualquer outro vício, pode ser a assembleia anulada judicialmente, o que levaria a situação a um “status quo anti” da aprovação, tornando-as reprováveis.

Do contrário, caso as contas não sejam apresentadas, deverá a massa condominial notificar extrajudicialmente o síndico, constituindo-o em mora da obrigação a fazê-lo, sob pena de não o fazendo os condôminos através de uma assembleia por eles ou pela administradora convocada, deliberar pela ação de exigir contas e assim proceder.

Sem isso, realmente, não há o chamado interesse de agir, tão necessário ao deslinde das ações judiciais (Art. 17 do NCPC).

Por fim, lembramos que o ideal mesmo é que não chegue a gestão do condomínio a tal ponto, sempre muito desgastante e gerador de enorme insegurança a todos, para isso, devem os condôminos e moradores, acompanharem de perto a gestão do condomínio, participando das assembleias, tirando dúvidas, esclarecendo pontos duvidosos, demonstrando com isso ao Síndico e administradora que estão atentos a gestão patrimonial, o que, por si só, muitas vezes inibe a atuação dos maus intencionados.

*  Advogado militante na área Condominial; Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC-SP; Especializado em Direito Imobiliário pelo UniFMU; Especializado em Processo Civil pela ESA/OAB/SP; Vice-Presidente da Comissão de Direito Condominial, Membro da Comissão de Direito Urbanístico, ambas da OAB/SP e Relator do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP, Conferencista da OAB/SP, AASP e do curso de Pós-Graduação em Direito Imobiliário na Faculdade 2 de Julho (Salvador) e Diretor Jurídico do Instituto Pró-Síndico, Coautor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação” (Editora Saraiva) e Autor do livro “Legislação Condominial: aplicação prática”, Ed. Educamais, (prelo); Colunista do sites especializados “Sindiconet” e “Licitamais”, articulistas de vários meios de mídia como a o programa “Metrópole Imobiliário” da Rádio Metrópole FM (Salvador/Bahia);   “Edifício Legal” da rádio CBN-RO e “A hora do povo” da rádio Capital-SP e do Programa “Dito e Feito” da Rádio Nacional (Rio de Janeiro/RJ), Sócio-diretor da Alexandre Marques Sociedade de Advogados.
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