Regras bem elaboradas podem garantir boa convivência em condomínios

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Problemas de convivência em condomínios podem ser uma dor de cabeça para moradores. Veja orientações para diminuição de conflitos

 

 

Há pouco mais de um ano, Yohanny Barboza resolveu investir em um condomínio de loteamento horizontal. Para chegar à decisão final de onde morar, a família levou em consideração a sensação de segurança. O imóvel escolhido por ela e pelo marido, um policial militar de 30 anos, fica localizado em um condomínio de classe média, em uma área habitacional em expansão em Campina Grande. Guarita com vigilância 24 horas e o monitoramento de entrada e saída de visitantes foram alguns dos itens que atraíram o recém-casal. Mas o encanto durou pouco.

“Bandido sabe a rotina de polícia. Fomos falar com a administração porque deixam todo mundo entrar, assim, de bolo, sem falar com a gente. O regimento do condomínio diz que o visitante será liberado mediante autorização do morador, independente se o porteiro já conhece. Mas, por exemplo, se minha mãe está vindo e eles já sabem que ela é minha mãe, eles não ligam avisando ou perguntando se ela está liberada mesmo. Não se cogita a ideia de ela estar com mais alguém, um sequestrador, por exemplo”, disse.

Uma das maiores preocupações da família em ser ouvida pela administração do condomínio é não ter planos de mudar. “A gente fica chateado, não resta dúvidas. Estamos tentando resolver de todas as formas possíveis, justamente porque não temos planos de sair daqui. Quando investimos nosso dinheiro foi pensando, em longo prazo – pois queremos consolidar raízes – e por questão de bem estar e comodidade que o condomínio nos oferece. Temos uma filha bebê e queremos que ela tenha a oportunidade de brincar sabendo que não estará em perigo”, contou.

Condomínio de aluguel

A professora Emanuela Costa, 31 anos, mora há dois anos em um condomínio de casas. O dono é o próprio sogro e não tem síndico. Sem regimento que normatiza como os moradores devem proceder, tudo acaba resolvido na conversa. A questão é que a conta de energia não é individualizada, assim, todos pagam juntos pelo uso. “O problema é que a conta é compartilhada. São quatro casas e um único papel de luz. Daí tem gente que fica o dia todo em casa e paga a mesma coisa de quem passa o dia fora. Ninguém reclamou até então, e também não tem síndico. Eu queria ter mais voz pra reclamar, mas por ser um condomínio de um parente, não sou muito ouvida”, reclamou.

A conta compartilhada é só o primeiro dos problemas. Logo depois, vem aquele bem tradicional barulho da vizinha. E por causa desse “combo” que a família já faz planos de se mudar. “Ela sai muito cedo e chega muito tarde. Então nesses horários têm sempre porta batendo máquina de lavar funcionando e gente falando alto. Temos planos de nos mudar. Ir para uma casa. Mas condomínio, acho que nunca mais”.

Quando a Justiça facilita

O contador Alberto Vasconcelos trabalha há 11 anos com administração de condomínios, um deles com 125 unidades independentes. Para ele, somente com a participação da Justiça os envolvidos em problema entram em consenso. “Um dos episódios que foi parar na Justiça foi uma questão por causa do uso de garagens. Após tentativas, a gente preferiu, junto com o sindico, judicializar o caso em um juizado de pequenas causas. Graças a Deus na primeira audiência chegaram a um acordo. Diante do juiz todos fazem as pazes”, afirmou.

A curta experiência de síndica: “nunca mais!”

Se resolver o problema de um vizinho é difícil, o que dizer da psicóloga Laryssa Alves, que iniciou sua curta experiência como síndica em um condomínio com 864 apartamentos? Entre a eleição e a decisão de deixar o cargo, que dividia com um vizinho, foram oito meses. Nesse meio tempo ela foi chamada para resolver problemas de violência doméstica; precisou educar as pessoas a jogarem o lixo na lixeira (sim, ainda sim!); teve a porta quebrada com chave de fenda e ainda ficou presa, do lado de fora, depois de um morador jogar supercola na sua fechadura. “Eu perdi as contas de quantas vezes fui à delegacia prestar queixa, o mínimo que fosse, por causa da insegurança causada pelo cargo”, lembrou.

O problema começou assim que a construtora entregou metade das unidades. “As pessoas que chegaram ali nunca tinham morado em apartamento e não tinham o bom senso de entender que há deveres, além dos direitos. As pessoas achavam que tinham direito de fazer muitas coisas, mas não queriam cumprir deveres. O local de colocar o lixo, por exemplo. As pessoas não queriam colocar o lixo nas lixeiras, queriam colocar o lixo na porta delas ou em locais que não foram feitos para aquilo. Aí vieram os problemas da área de lazer; os cachorros que faziam cocô em locais não permitidos, e os donos não recolhiam; crianças sozinhas sem supervisão. Deu trabalho educar as pessoas”, recordou.

Mas nada deu mais dor de cabeça, do que morar no condomínio que administrava. E não demorou muito tempo, mesmo depois de deixar o cargo, a deixar também o apartamento, onde morou desde a lua de mel.

“Como a gente era síndico e morávamos lá também, as pessoas se sentiam no direito de ir até nossa porta para resolver seus problemas. Teve um dia que uma mulher saiu reclamando porque eu não a convidei a entrar no meu apartamento.

Como se meu apartamento fizesse parte da administração do condomínio! Hoje em dia isso já esta melhor estabelecido por lá, mas na época, era uma novidade, então as regras estavam sendo construídas e as demandas iam aparecendo conforme o tempo ia passando. Então de repente acontecia uma situação e a gente precisava do nada criar uma ‘lei’. Esse processo foi difícil.

Tudo isso pesou muito na decisão de nos mudarmos. Nunca mais na vida quero esse trabalho. A não ser que seja a muitos quilômetros de distância de mim. Eu só fiquei todo esse tempo, porque eu queria acreditar no ser humano”.

“O legislador, atento à realidade das coisas e ciente de que a convivência nesse ambiente especial tem muitas peculiaridades, promoveu regramento específico, limitando o direito de propriedade, visto que a harmonia exige espírito de cooperação, solidariedade, mútuo respeito e tolerância, que deve nortear o comportamento dos condôminos.” – Luiz Felipe Salomão. Ministro do STJ

O que diz a lei do inquilinato

Ela é relativamente jovem, mas é considerada complexa pelos juristas. A lei do inquilinato, de 1991, rege sobre direitos e deveres do inquilino – ou seja, quem mora de aluguel. Como a fica a questão do inquilino que mora em condomínio, então? Segundo o advogado especialista em direito empresarial, André Cabral, nem tudo é dever do locatário. “Se o bem locado faz parte de um condomínio, cabe ao locatário/proprietário pagar quaisquer despesas extraordinárias, como por exemplo: reformas ou manutenção da fachada. Outro ponto importante de se observar são as eventuais indenizações trabalhistas e previdenciárias de empregados do condomínio. Neste caso, deve-se observar se as obrigações tem fato gerador antes do início da locação ou depois. Sendo anteriores são de obrigação do locador/proprietário. Outros direitos e deveres estão na lei do inquilinato e é importante, conforme o caso concreto, as partes observarem regras específicas para alguns contratos, como por exemplo, shopping centers, aluguel de temporada, build to suit, entre outros”, explicou.

Perguntas mais frequentes

Em que casos a lei pode ser aplicada?

– A lei do inquilinato será sempre aplicada quando houver a locação de imóvel urbano. Se a locação for de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de suas autarquias e fundações públicas; de vagas autônomas de garagem ou de espaços para estacionamento de veículos; de espaços destinados à publicidade; em apart- hotéis, hotéis – residência ou equiparados, assim considerados aqueles que prestam serviços regulares a seus usuários e como tais sejam autorizados a funcionar; ou de arrendamento mercantil, em qualquer de suas modalidades, a relação de locação deve ser regulada pelo Código Civil e/ou outras leis especiais.

O que acontece com o síndico omisso?

– O síndico omisso deve ser denunciado perante a assembleia geral de condôminos que poderá o destituir da função ou, simplesmente, conseguir que o síndico cumpra suas funções devidamente. Em casos extremos, tem-se sempre a hipótese de se buscar o judiciário em socorro de direitos não observados pelo síndico e/ou condomínio.

Síndico condômino ou empresa especializada?

– Aqui, é de fato uma questão de escolha do grupo de condôminos. Síndico bom é aquele comprometido e atencioso com os interesses da coletividade do condomínio. Portanto, a honestidade, a dedicação e habilidade social de conviver bem e apaziguar conflitos são as maiores virtudes de um síndico. Entretanto, há quem defenda que o síndico profissional tem a vantagem de não está envolvido diretamente com as emoções e interesses existentes no condomínio.

Mantendo uma distância sadia, nessa linha, o síndico profissional é capaz de aplicar as normas da lei, convenção e regimentos com mais tranquilidade e imparcialidade. Trata-se de uma visão influenciada pela ideia da apatia estoica que inspira a imparcialidade que deve sempre guiar um bom juiz. Afinal, muitas vezes o síndico faz esse papel de mediador, árbitro e até, de juiz dentro do condomínio quando interpreta e aplica suas normas. Porém, muitas empresas que ofertam esse serviço são criticadas por não darem a atenção suficiente que os condomínios necessitam. Por isso, finalmente, cabe a cada condomínio pensar bem e buscar o modelo que melhor se adequa a sua realidade e interesses.

 

Fonte: André Cabral, advogado

*Texto de Renata Fabrício, do Jornal Correio 

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