O que é Compliance e como pode ser aplicado em Condomínios

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A cultura da transparência, que já faz parte do dia a dia de muitas empresas, pode ser instituída na sua gestão condominial

Ao lado da descoberta de escândalos, desvios de dinheiro, uso indevido do poder nas instituições públicas e na esfera política que deixaram os horizontes nublados (e os ânimos alterados), uma boa perspectiva merece ser considerada.

Nunca, como nos tempos atuais, os termos transparência, ética, anticorrupção, prestação de contas e ficha limpa foram tão comentados na pauta da grande mídia.

A sociedade passou a prestar mais atenção à conduta nas instituições e a exigir transparência nas ações. No ambiente corporativo, essa preocupação em zelar pela integridade nas empresas é resumida na palavra: COMPLIANCE.

Mundialmente, a transparência nas corporações se tornou uma moeda de peso e passou a ter grande valor de mercado. Somado à luz sobre a corrupção lançada pela Operação Lava Jato, o conceito do compliance entrou na agenda dos gestores brasileiros.

E nos condomínios, há espaço para Compliance? Os benefícios compensam o investimento? Como aplicar? Essas e outras questões são apresentadas no conteúdo abaixo. Confira!

O que é Compliance?

Do inglês to comply, compliance significa agir em conformidade com uma regra ou procedimento.

“O compliance pressupõe estar de acordo com as leis e os regulamentos internos e externos determinados pela empresa”, resume  Elvis Leal, gerente de RH do Grupo Robotton Negócios Imobiliários e membro do Comitê Gestor Compliance Antissuborno ISO 37001.

Em 2015, a ISO 37001 normalizou internacionalmente o compliance. “Ela é baseada na Lei Antissuborno, por isso, sempre que se fala em compliance, o conceito se remete à essa lei”, diz Leal, da Robotton.

A empresa, especializada em administração condominial e mercado imobiliário, conquistou a ISO em 2016 e, desde então, aplica o compliance em seus condomínios administrados, baseado no que estipula a certificação.

O compliance aplicado em condomínios

No universo de um condomínio, o compliance tem a mesma relevância, se comparado ao ambiente corporativo.

Segundo Thiago Badaró, advogado especialista em Direito Condominial e Imobiliário, e sócio-fundador do escritório Badaró Advocacia Empresarial, embora o condomínio tenha natureza distinta de uma empresa, é possível afirmar que não existem diferenças entre a aplicação do compliance em ambos.

“A inserção de um processo de compliance dentro do condomínio, assim como em uma empresa, tem o objetivo de seguir rigorosamente o que determinam as leis vigentes no nosso país e a ética, principalmente no que diz respeito ao tratamento com funcionários e fornecedores”, diz Badaró.

Para a síndica profissional Natachy Petrini, não basta mais aos síndicos ser honestos. “Eles precisam dar mostras constantes disso por meio de processos transparentes, política ética e estruturada. Nisso, o compliance atesta os procedimentos e auxilia em sua demonstração aos moradores”.

Embora seja uma realidade nova no Brasil, a aplicação do compliance já traz resultados. “Atualmente trabalhamos com assessoria na implementação e manutenção de processos de compliance em condomínios e acompanhamos bem de perto os resultados”, conta Badaró.

O advogado destaca o acompanhamento e a avaliação dos contratos com prestadores de serviço de um condomínio. Segundo ele, foi possível a obtenção de serviços com mais qualidade e redução significativa de custos e, principalmente, reduzindo a carga de impostos.

“Em três condomínios, sendo um deles com 1215 unidades, temos uma administradora que já adota o termo de compliance há algum tempo, passando por auditorias constantes sobre seus procedimentos, o que termina por auxiliar os síndicos na adoção das mesmas medidas no dia a dia do condomínio e sempre que o apoio operacional e administrativo é solicitado”, conta Natachy.

O suborno bate à porta do condomínio

Pense no universo do condomínio. Funcionários, fornecedores, zelador, gerente predial, fornecedores, condôminos e o próprio síndico — todos estabelecem relações entre si, sujeitas a escorregadelas de conduta.

Nelas, pode ocorrer o suborno, que está em facilitar alguma coisa, impor alguma vantagem, e não necessariamente um ato que envolve dinheiro.

“Dentro de um condomínio, é muito fácil ocorrer situações em que cabem suborno — desde um imóvel a ser alugado, em que uma imobiliária é favorecida em detrimento de outras; um contrato de manutenção ou prestação de serviço, um presente do morador pelo favor que pedirá ao porteiro”, menciona Leal, da Robotton. São situações que podem ocorrer e não são raras. O compliance, diz, atua para evitar que o delito aconteça.

Compliance não é auditoria

Diferentemente de uma auditoria, cujo profissional analisa o histórico passado e presente das finanças e condutas de um condomínio, o compliance é um exercício diário de avaliação sobre os processos atuais e os que se pretende chegar no condomínio: “Sempre questionando se as melhores práticas estão sendo colocadas em vigor”.

Isso se estende desde à solicitação de orçamentos, de modo a buscar as melhores condições, até ações mais subjetivas, mas tão importantes quanto a tomada de preço, que é a ação pensada no coletivo, de maneira controlada, ética e transparente.

O compliance não depende só de uma lei. Seu olhar é mais abrangente: vai além dos números, tem valores éticos e morais que envolvem o estar de acordo com uma regra, principalmente o regulamento interno do condomínio.

“Para se ter um bom convívio, toda a comunidade deve estar de acordo com a regra. Se um sair disso, destoa todo o coletivo”, diz Leal.

Já a auditoria é um exame sistemático das atividades desenvolvidas em determinada empresa ou setor. Marcos Roberto Gouveia, sócio da Odara Auditoria, explica que o objetivo da auditoria é averiguar se elas estão de acordo com as disposições planejadas e estabelecidas previamente, se foram implementadas com eficácia e se estão adequadas.

“Dessa forma, a auditoria ajuda na realização do compliance e no cumprimento de procedimentos como orçamentos, definições para contratações e planos de concorrência e  investimentos. Juntos, podem contribuir com a minimização dos riscos de irregularidades ”, diz.

Passo a passo para implantar o compliance

1. VONTADE DE REALIZAR O COMPLIANCE

Por mais simples que seja, esse é o primeiro passo para o projeto acontecer. É importante que o síndico ou gestor condominial entenda como o compliance vai ajudar a diminuir problemas de diversas ordens.

2. MAPEAMENTO DO CONDOMÍNIO

Os condomínios não são iguais. Mesmo que estruturalmente parecidos, cada um tem sua cultura, estilo de moradores, funcionários, entre outros fatores que tornam aquele espaço único e diferente dos demais.

Nessa etapa, é muito importante listar todas as situações possíveis de ocorrer algum delito, comportamento abusivo, suborno ou qualquer irregularidade.

3. REDIGIR O MANUAL DE BOAS PRÁTICAS

Com base em todas as informações reunidas, organize as regras e políticas de conduta em um manual simples, de modo que o seu foco, no caso o funcionário, compreenda o que está sendo proposto.

“Na Robotton, temos o manual de compliance implantado. Ele abrange nossos fornecedores e funcionários. Todo funcionário contratado recebe um treinamento, um manual, assina e se compromete a cumprir com aqueles requisitos que estão baseados na norma que rege o compliance”, conta Leal, da Robotton.

O manual deve ser direcionado aos vários públicos – funcionários, prestadores de serviços e fornecedores, e também para os condôminos. De preferência, um para cada público, já que cada um tem diferentes características e níveis de relação.

Badaró também destaca a criação de procedimentos para a contratação de prestadores de serviços, compras de produtos e materiais de uso do condomínio, privilegiando a clareza, principalmente, na prestação de contas com os moradores.

4. INVESTIR EM TREINAMENTO E ENGAJAMENTO

Não adianta fazer a organização de tudo, consertar problemas se aqueles que trabalham no condomínio não sabem como agir ou trabalhar dentro das normas, leis e políticas daquele espaço. O treinamento, desde que constante (com reciclagens periódicas), permite que os problemas sejam minimizados.

“Sozinho, o síndico não fará nada. Ele precisa do envolvimento e do engajamento de seus funcionários. O mesmo se aplica aos condôminos, que devem estar conscientes dos objetivos do compliance, aos fornecedores e prestadores de serviços”, lembra Leal.

5. ORGANIZAR UM COMITÊ GESTOR

Pode ser formado, basicamente, pelas pessoas que compõem o Conselho. Como síndico, você pode participar; porém, é necessário que o grupo de pessoas acompanhe a sua atuação.

“O síndico também precisa ser submetido às regras do compliance. Ele pode ser facilmente corruptível, ou um potencial corruptor”, afirma Leal.

6. CANAIS DE COMUNICAÇÃO

É imprescindível que todos os setores dentro do condomínio se comuniquem e que tenham como ponto em comum o síndico para as melhores tomadas de decisão. Dessa forma, tanto medidas preventivas como paliativas poderão ser tomadas evitando impactos financeiros, entre outros, no condomínio.

Os canais também podem ser anônimos para que não haja problemas entre os funcionários que relatar determinado tipo de situação estranha ao processo implementado. “Se o condomínio tiver um site, crie um espaço chamado Transparência para denúncias. No caso das anônimas, sugira que a pessoa crie um e-mail anonimo@gmail.com, por exemplo”, diz Leal.

7. FAZER O ACOMPANHAMENTO DOS RESULTADOS E ROTINAS

Com os processos definidos, políticas e legislações expostas de forma clara e treinamentos realizados, o próximo passo é acompanhar o andamento disso tudo na prática.

8. DÊ O FEEDBACK

Thiago Badaró indica a realização de relatórios internos e o acompanhamento dos feedbacks dos funcionários e prestadores de serviço: “São medidas essenciais para que saber que o compliance está andando conforme planejado”.

Ao constatar o fato, Leal da Robotton indica que seja feita uma advertência, verbal ou escrita, mas algo formal e incisivo, até para dar um bom feedback para quem denunciou. “A partir daí, adequar e reforçar o treinamento e, em medida mediana, uma suspensão; e, em um caso mais drástico, uma rescisão de contrato”.

O síndico precisa de capacitação em compliance

Justamente pelo compliance ser uma prática recente, especialmente em condomínios, é importante que o síndico entenda o conceito, como implantar e fazer o acompanhamento. Sendo assim, mesmo que a opção do condomínio seja contratar um escritório especializado, buscar informação e se preparar é o melhor caminho.

Atualmente existem vários cursos, inclusive de instituições renomadas no nosso país, que trazem toda a bagagem de compliance para gestores dos mais variados ramos de atividade. É importante que o síndico busque esse tipo de formação se possível com foco na área condominial, segundo Badaró.

“Há cursos específicos para esta área, além disto há farto material para estudos e aprofundamento nesta matéria, em que o profissional que queira trazer os benefícios que estes procedimentos para seu condomínio, em pouco tempo, colherá os frutos da melhoria significativa em sua gestão”, diz Gouveia, da Odara Auditoria.

A tecnologia pode ajudar

Cada vez mais o mundo virtual vem se integrando às práticas de gestão e com o compliance as coisas não são diferentes.

“Já existem softwares e aplicativos específico para as empresas que utilizam algum processo de compliance em sua rotina e, muito em breve, os condomínios terão mais acesso a este tipo de tecnologia também”, observa Badaró.

Leal lembra, ainda, que existem ferramentas de comunicação entre os condôminos. “Temos alguns softwares voltados para o condomínio, que fazem a comunicação dos funcionários com os condôminos, por exemplo, reserva do salão de festa, recados, avisos, orientações…”, diz.

Existem,ainda, os portais que são voltados para o condomínio. “Nele, poderia ter uma área para o registro de uma eventual denúncia. O principal é que se crie esse canal de comunicação”, reforça.

Se achar necessário, contrate especialistas

Para Badaró, o grande problema de tentar implementar sozinho o compliance é a possibilidade de interpretação equivocada de alguma lei ou desconhecimento da mesma.

“Quando falamos de seguir à risca o que a legislação e a ética determinam, é importante que a execução do processo de compliance seja feita por um advogado que entenda bem da rotina condominial e das leis aplicáveis ao condomínio”, aconselha.

A Robotton contratou uma consultoria para implantar o compliance na própria empresa. “Não que seja impossível implantar sozinho, mas é fundamental conhecer e seguir cada etapa do processo, incluindo o acompanhamento constante e, principalmente, construir o manual das boas práticas”, diz o executivo da Robotton.

Por exemplo, prossegue, cada função no condomínio tem suas regras: “Tudo o que cabe e o que não cabe para o porteiro, o zelador, o gerente predial, se for o caso. É preciso deixar muito claro o que pode e o que não pode”. A transparência é o que passará a permear as relações.

Dê o primeiro passo

Seu condomínio não precisa atingir a excelência da ISO. O fato de não contratar um escritório especializado muito menos será um impeditivo para que você, como síndico, viabilize o compliance.

Ao contrário, ele pode começar como um projeto simples, que terá um conselho gestor, um manual de boas práticas, um canal de comunicação e, acima de tudo, a sua vontade unida ao engajamento das pessoas que participam do condomínio.

Esse é o caminho para que a transparência e a ética passem a permear todas as relações.Parabéns pela atitude e boa sorte!

Fonte: SíndicoNet

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