Barulho em condomínio: veja exemplo de parecer sobre o tema

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O barulho é um dos maiores causadores de conflitos entre vizinhos, principalmente em condomínios, onde a proximidade entre os moradores é maior.

A legislação brasileira contém diversos dispositivos que garantem o direito ao sossego do morador em condomínio, vítima constante do barulho.

A Lei do Condomínio (Lei nº 4.591/1964), em seu artigo 19, assevera:

Art. 19 – Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionados, umas e outros, às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculos ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos.

O artigo 21, da referida lei, também assegura que:

Art. 21 – A violação de qualquer dos deveres estipulados na convenção sujeitará o infrator à multa fixada na própria convenção ou no regimento interno, sem prejuízo da responsabilidade civil ou criminal que, no caso, couber.

A Lei Federal nº 3.688/1941, também conhecida como Lei de Contravenções Penais, tipifica como infração penal a perturbação do sossego ou do trabalho alheio:

Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheio:

I – com gritaria ou algazarra;

II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

Por fim, e não menos importante, o Código Civil também limita o nível de ruído provocado por uma unidade, inclusive durante o dia.

Art. 1.336. São deveres do condômino:

(…)IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

O mesmo artigo prevê, em seu parágrafo segundo, a possibilidade de aplicação de multa não superior a cinco vezes o valor da contribuição mensal para os condôminos que desrespeitarem o inciso IV, do artigo 1.336. In verbis:

2o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembléia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

Vale ressaltar que o condômino que reiteradamente descumpre com os deveres condominiais, poderá ser constrangido a pagar multa de até cinco vezes do valor da taxa condominial, independentemente das perdas e danos:

Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

Por fim, o Código Civil, no parágrafo único do artigo 1.337, dispõe que o condômino gerador de incompatibilidade de convivência com os demais condôminos poderá ser constrangido a pagar multa no valor do décuplo da taxa condominial.

Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia. (GRIFO NOSSO)

A praxe mostra que a melhor solução para o caso em comento é o acordo. Quando a conciliação resta infrutífera, cabe ao síndico, com base nas disposições da Convenção Condominial, advertir o condômino barulhento e, caso não haja resultado, aplicar-lhe as multas previstas.

Entretanto, muitas vezes essas soluções extrajudiciais não ensejam êxito, obrigando o condômino recorrer ao Poder Judiciário, a fim de garantir uma efetiva proteção de seus direitos.

Nenhum dos artigos presentes no Estatuto da Criança e do Adolescente refere-se à proteção do menor no caso em comento. Até porque lei nesse sentido já prevê a proteção contra o barulho, independentemente da faixa etária daquele que sofre a lesão.

No presente caso, a solução não está mais nas leis, mas sim na técnica processual. Quando uma pessoa tem um direito violado e ajuíza uma ação no Poder Judiciário a fim de que este solucione seu problema, de nada adianta as leis ou a sentença que garantam o seu pedido.

Se um condômino chega ao ponto de ajuizar uma ação contra um condômino barulhento é porque nenhuma das demais soluções extrajudiciais foram efetivas, e o barulho já está em um ponto de insuportabilidade, inviabilizando ainda mais qualquer tentativa de conciliação.

O que a pessoa quer é a solução na prática, não uma declaração de seu direito em uma mera folha de papel. Se já houve o ajuizamento de uma ação é necessário que o juiz da causa aplique as medidas necessárias a garantir a tutela efetiva do direito material do autor. Em outras palavras, o juiz deve fazer valer o direito do autor na prática.

Para isso, o Código de Processo Civil Brasileiro (Lei nº 5.869/1973) traz soluções efetivas, em seu artigo 461 transcrito abaixo:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

(…)

§ 3o  Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§ 4o  O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

O referido artigo dispõe a tutela específica do direito material. São as garantias aplicáveis pelo juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a fim de obrigar a parte que viola o direito do autor a fazer ou não fazer determinada coisa.

Entretanto, como esse artigo poderia solucionar efetivamente o problema no caso concreto? Basta que na ação já ajuizada requeira-se ao juiz que ordene o condômino barulhento a cumprir o determinado na Convenção Condominial sob pena de multa.

Caso o condômino venha a descumprir essa ordem judicial, a multa imediatamente poderá ser executada mediante a penhora online. Se persistir esse problema, o juiz poderá cominar uma multa maior até forçar o condômino a evitar a lesão ao direito alheio.

Também é importante frisar que não é necessário esperar até o fim do processo para a aplicação do referido texto legal. É plenamente possível, com base no art. 461, § 3º, a concessão de tutela liminar, ou seja, o juiz poderá impor a multa desde o início do processo, nos casos em que seja relevante o fundamento da demanda e haja justificado receio de ineficácia do provimento final.

Esse é o posicionamento que vem sendo aplicado pelos Tribunais e que, na prática, tem-se mostrado efetivo:

CIVIL. PROCESSO CIVIL. ILEGITIMIDADE DE PARTE. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CONDIÇÕES DA AÇÃO. INTERESSE DE AGIR. NECESSIDADE. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. BARULHO EXCESSIVO. REPOUSO NOTURNO. CONDOMÍNIO. OUTRAS AÇÕES. MULTA CONDOMINIAL. LIVRE ACESSO A JUSTIÇA.

1. O proprietário de bem imóvel é responsável pelo pagamento de multa por infração à convenção condominial praticada por quem habita sua propriedade, em face da obrigação de vigilância que deve ter sobre os acontecimentos relacionados com a sua propriedade, e uma vez acionado, não pode alegar ilegitimidade de parte.

2. A extinção da ação sem julgamento do mérito não configura cerceamento de defesa.

3. Tem interesse de agir o condomínio, em ação de obrigação de fazer, ao não conseguir solução amigável para fazer cessar os barulhos excessivos produzidos pelo réu, especialmente durante o período do repouso noturno, apenas com conversas, notificações e aplicação de multa ao condômino transgressor.

4. Outras ações intentadas contra o condômino, com objetos diversos, bem como a aplicação de multa pelo condomínio, não obstaculizam o prosseguimento da ação de obrigação de fazer.

5. Rejeitou-se as preliminares de ilegitimidade de parte da 2ª ré e a de cerceamento de defesa e deu- se parcial provimento ao apelo do autor para determinar ao réu que não produza barulhos excessivos no condomínio, sob pena de pagamento de multa. (TJDF; Rec 2009.01.1.181633-6; Ac. 530.304; Segunda Turma Cível; Rel. Des. Sérgio Rocha; DJDFTE 29/08/2011; Pág. 1306) (GRIFO NOSSO)

USO NOCIVO DA PROPRIEDADE. CONDOMÍNIO E VIZINHANÇA. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. POLUIÇÃO SONORA CAUSADA POR UTILIZAÇÃO ABUSIVA DE APARELHO DE SOM (RÁDIO E CD) EM HORÁRIO DE REPOUSO NOTURNO. DESCUMPRIMENTO ÀS NORMAS ATINENTES AO CONVÍVIO SOCIAL. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO À ABSTENÇÃO DE TAL PRÁTICA.

1. Havendo a perturbação do sossego em face de utilização indevida de aparelho de som (com volume excessivo) pelo réu, mostra-se adequado o pedido de abstenção de tal prática quando comprovada a perturbação, em função do barulho, comprometedora do sossego familiar.

2. A obrigação de não fazer (abstenção de manter o aparelho de som em volume alto), respeitando o horário de descanso, 22h, imposta na sentença de primeiro grau, visa a garantir o convívio pacífico da vizinhança e está respaldada pelas normas que regulam as relações sociais previstas na Legislação Civil. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. Recurso improvido. (TJRS; RCiv 71001517911; Sapiranga; Primeira Turma Recursal Cível; Rel. Des. Ricardo Torres Hermann; Julg. 27/03/2008; DOERS 02/04/2008; Pág. 114) (GRIFO NOSSO)

Não obstante essa solução, deve-se priorizar sempre a conciliação, posto que soluciona de forma mais célere o conflito. Muitas vezes, quando há barulho de salto alto, recomenda-se a colocação de tapetes ou carpetes. No caso de móveis, indica-se a colocação de carpetes protetores, a fim de abafar o ruído ao arrastar o objeto.

A procura da solução na Justiça muitas vezes agrava ainda mais o conflito entre os vizinhos. Um experiente conciliador pode resolver esse caso, apresentando formas de amenizar o desgaste entre as partes sem a necessidade de recorrer ao Poder Judiciário.

Sem mais para o momento, colocamo-nos à sua inteira disposição para eventuais esclarecimentos, bem como para novas pesquisas.

Este é o parecer.

Ricardo Magno Quadros

www.telecondo.com.br via vivaocondominio.com.br

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