Leve a Comunicação Não-Violenta para o seu condomínio

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Conheça a técnica que pode ajudar a resolver conflitos entre vizinhos e a manter a harmonia geral

 

Você já ouviu falar em Comunicação Não-violenta (CNV)? Muita gente pratica essa metodologia, que nasceu nos Estados Unidos e, hoje, é conhecida no mundo inteiro.

Mas o que isso teria a ver com condomínio? A resposta é: tudo.

A forma como nos comunicamos determina muito a qualidade das nossas relações. Só que, volta e meia, as questões do dia a dia nos fazem esquecer dessa verdade tão elementar.

É nesse terreno fértil que nascem as discórdias. A maioria dos conflitos que temos com outras pessoas é causada, principalmente, pela nossa má comunicação, mais do que propriamente pelas diferenças de opinião.

“Em um ambiente que estimule a competitividade, a dominação e a agressividade, tendemos a nos comportar violentamente. Da mesma forma, em um ambiente que estimule a cooperação e o acolhimento, tendemos a agir com generosidade”, traduz Carlos Savoy, especialista em mediação de conflitos.

A CNV atua justamente para modular o tom da nossa comunicação. Pode ser usada como ferramenta nas mais diversas situações – ambiente familiar, corporativo, acadêmico, diplomático e também no condomínio — e por qualquer pessoa. Onde houver gente, a CNV pode ser aplicada.

“Desde que ela esteja disposta a se abrir e a deixar de lado as respostas automáticas, a ideia de culpa e julgamento”, resume Carina Abud Alvarenga, mediadora de conflitos.

De onde surgiu a Comunicação Não-violenta

A CNV nasceu nos anos 1970, pelas mãos do psicólogo norte-americano Marshall Rosenberg.

Ao conviver na Detroit urbana e violenta, em plena luta contra o preconceito racial, o jovem Rosenberg foi motivado pelo ideal de criar uma cultura mais pacífica e baseada na empatia.

Sua obra mais importante, “Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais”, virou uma espécie de bíblia para profissionais ou qualquer pessoa interessada em aprimoramento das relações interpessoais.

“Muitas das habilidades ensinadas pela CNV já são de conhecimento prévio de todos nós, seres humanos. Ao resgatarmos tais competências por meio do processo da Comunicação Não-Violenta, passamos a reformular a maneira pela qual nos expressamos e ouvimos os outros. Isso é transformador”, diz Carina.

Como funciona a CNV

O processo da CNV foi organizado de maneira a enxergarmos as coisas em quatro passos bem simples, e que a partir dessa simplicidade possamos melhorar a nossa comunicação, torná-la mais efetiva, ser melhor compreendido e compreender o outro também.

1o. PASSO: Observação

Volte o olhar para dentro de si. Pense no fato que motivou o conflito. Procure limpar julgamentos e preconceitos, e então olhe para a situação, sem uma opinião já formada sobre aquilo.

“Na vida, normalmente vemos uma situação que nos parece estranha e já formamos um julgamento sobre aquilo. Não nos aproximamos do objeto ou da situação, mas já criticamos aquilo com uma opinião”, constata  Gleice Marote, Coach, Mediadora e Consultora em Desenvolvimento Humano e Organizacional.

2o. PASSO: Sentimento

Perceba o que determinada situação gerou (provavelmente um conflito) e quais sentimentos foram despertados em você.

Pergunte-se: O que eu sinto, quando lido com essa situação?

“A constituição humana é formada por um pensar, um sentir e um querer. O processo da CNV permite que entremos em contato com essas três dimensões”, descreve Gleice.

3o. PASSO: Necessidade

Levante qual é a sua necessidade. Ou seja, pense no que você precisa para resolver aquela situação. Da mesma forma, pense no outro. Se coloque no lugar dele e tente entender o que o incomoda na situação.

A partir do reconhecimento do seu pensar, sentir e querer, você verá que isso existe no outro também.

Junto com ele ou empatizando com ele, busque o significado desse pensamento que está vivo. Às vezes, são opiniões e julgamentos diferentes sobre uma mesma situação; e isso, muitas vezes, nos coloca num conflito.

“Quando acessamos esse lugar do sentimento, podemos nos conectar mais com o outro — ver o impacto que a nossa ação está gerando, e o que a ação do outro está despertando em nós”, explica Gleice.

4o. PASSO: Pedido

Construa acordos, identificando quais as capacidades e as necessidades envolvidas naquela situação. Com gentileza, demonstre o quanto você entende o ocorrido e, principalmente, o lado dele.

Não é uma exigência, como seria num diálogo comum; mas algo direcionado ao outro, a partir do nosso sentimento e da necessidade. Sempre com o reconhecimento de que o outro pode dizer sim ou não.

A aplicação da ferramenta de comunicação no condomínio

Se pensarmos no dia a dia de um síndico, essa comunicação pode ser utilizada em assembleias, também em conflitos individuais (com moradores) dentro do condomínio, em tratativa com funcionários ou prestadores de serviços.

Os especialistas separaram dois exemplos práticos de aplicação da CNV no condomínio.

Caso 1

Desentendimentos por vagas na garagem foi resolvido com a CNV, por Carlos Savoy:

Em um condomínio, no Bairro de Moema/São Paulo, as demarcações das vagas estavam feitas há bastante tempo. Como não eram vagas fixas, quem chegasse antes pararia nas melhores.

Na última vaga, onde sempre parava um mini cooper, existia uma vaga para motocicletas que atrapalhava a saída do carro. Para piorar a situação, a vaga da frente era sempre ocupada por uma caminhonete grande.

Situação: O dono do carro pequeno, sempre ficava mal-humorado pela vaga e parava em cima da vaga da moto, pois senão não conseguia manobrar o carro, por causa da caminhonete. Ele já não gostava do dono da caminhonete por causa desta situação. Ao mesmo tempo, o dono da caminhonete não sabia desse sentimento dele.

Ocorre que outros vizinhos começaram a reclamar do jeito que o mini cooper parava. O síndico mandou uma advertência que só piorou a situação, pois o dono do carro pequeno foi reclamar com o dono do carro grande, que o mesmo atrapalhava sua saída.

O conflito se intensificou quando o dono do carro pequeno recebeu uma multa por desobedecer as normas do condomínio referente às vagas.

Com o uso da CNV foi possível, facilmente, perceber as necessidades de todos e chegar a uma solução bem simples. A mera inversão da vaga da moto pela do carro pequeno (vizinhas), ajudava o carro a sair sem problemas.

O síndico simplesmente inverteu a pintura no chão, sem alterar nada. A multa foi cancelada pois o síndico entendeu a situação do dono do carro pequeno.

O dono do carro pequeno ficou feliz pois poderia sair sem problemas e todos os moradores ficaram felizes pois ganharam uma vaga melhor no prédio.

Caso 2

Um acontecimento com potencial de tornar-se uma grande discussão, mas que poderia ser tratado pelo processo da CNV, por Carina Alvarenga:

Morador: Assim não é possível… ninguém cuida desse prédio e você (Síndico) é incapaz de tomar qualquer atitude!”

A reação habitual do síndico seria a de escutar aquela afirmação, fazer um julgamento (“esse morador é realmente um babaca”) e, possivelmente, começar a defender-se daquela acusação.

A partir da CNV, a reação passa a ser a de escutar as necessidades por trás daquelas palavras, que a princípio o tiraram do sério.

Síndico: Você está irritado porque tem apreço pelo lugar onde mora e queria que as pessoas também o tivessem?

Morador: Sim, parece que não há cuidado e atenção com os bens comuns.

Síndico: Você fica chateado em ver as coisas se deteriorando e gostaria de ter a colaboração de todos para manter o condomínio com uma boa apresentação?

Morador: Sim, é exatamente isso que eu gostaria.

Síndico: Qual seria o seu pedido? Quais atitudes você espera da Administração?

Morador: Gostaria que fossem colocados avisos nas áreas comuns para que lembrassem de não pisar no jardim e para que devolvessem os pesos no lugar após o uso na academia. E conversas individuais com quem estiver desrespeitando essa solicitação.

Síndico: Sabe, quando você disse no início que ninguém cuidava do prédio e que eu era incapaz, me senti ofendido e humilhado e não concordei com a sua afirmação. Eu só estou aqui, pois considero esse trabalho importante e sei que as coisas bem cuidadas trazem bem-estar a todos por aqui, inclusive a mim. Gostaria queno futuro pudéssemos conversar mais e que você nos encaminhasse as ideias para contribuir com a manutenção dos espaços.

A conversa entre o síndico e o morador foi possível , graças à aplicação da CNV. A tensão antes presente se dissipou porque ambos perceberam que não eram adversários e o diálogo continuou com várias outras trocas de ideias.

Resumo dos 4 passos da CNV

  1. Aprender a observar e separar fatos de julgamentos;
  2. Consultar o seu sentir: “O que eu sinto diante daquela situação?”. E, no caso, não é um sinto que… que normalmente é complementado por um pensamento ou uma sensação. A ideia aqui é buscar o sentimento;
  3. Identificar suas necessidades e reconhecer o que é necessidade, que pode ser diferente do que é o interesse (estratégia);
  4. Preparar um pedido claro e objetivo para o outro.

Conversando da maneira certa, todos se entendem

O síndico é, muitas vezes, o alvo das reclamações, como se a responsabilidade de tudo fosse dele, e não uma responsabilidade compartilhada por aquele grupo de pessoas que convivem no mesmo espaço.  A Comunicação Não-Violenta poderá ajudá-lo a lidar melhor e a se posicionar melhor nas questões. Ao se conectar mais com o outro, também vai ajudar esse outro a enxergar a si próprio.

“O importante é ele se capacitar. Isso porque tendemos a não falar as coisa do jeito que realmente são. E, quando falamos, agredimos o outro”, diz Carlos Savoy.

O passo a passo, ele completa, está baseado numa comunicação honesta e transparente para não machucar os outros; e para ouvir qualquer coisa dos outros, sem se ofender.

Sabemos que parece simples, e que na vida real, os conflitos são mais complexos. Os exemplos que mostramos acima dão uma pista de como as coisas podem ser resolvidas. Ou, pelo menos, de que é possívelchegar ao entendimento.

Como tudo na vida, praticar a Comunicação Não-Violenta exige preparo e treino contínuo. É um aprendizado constante, porque as relações humanas são feitas de contradições — simples, ao mesmo tempo, complicadas.

Fonte: https://www.sindiconet.com.br/

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